Glicoma Medicinal Marinho

Marine Medicinal Glycomics

Por: Vitor H. Pomin

O Glicoma é um projeto internacional que analisa sistematicamente e comparativamente as propriedades estruturais e biológicas, gerais ou específicas, dos carboidratos, também conhecidos como glicanos ou açúcares, dentro de um repertório de um determinado tipo de célula, tecido, organismo, reino, ou até mesmo de um tipo de ambiente, sob uma determinada condição. O Glicoma é um dos últimos projetos lançados na biologia, onde inúmeros outros já estão em pesquisa e desenvolvimento, tais como Genoma, Transcriptoma, Proteoma, Metaboloma, Lipidoma, e outros.

A entrada recente e atrasada do Glicoma na biologia é consequência de vários fatores, dentre eles: (i) a dificuldade científica e tecnológica no estudo de carboidratos; (ii) a ausência de métodos automáticos para sequenciamento da composição primária, diferente de ácidos nucléicos e proteínas que já são analisados rotineramente por sequenciadores; (iii) a alta flexibilidade conformacional e alta variabilidade estrutural e composicional dos polissacarídeos; e (iv) a concepção de que as moléculas da classe de carboidratos estão envolvidas apenas no armazenamento de energia ou na composição estrutural das paredes celulares de algas e plantas ou dos exoesqueletos de crustáceos e insetos. Porém, essa concepção limitada vem mudando drasticamente com a descoberta de novas funções biológicas desempenhadas pelos carboidratos, assim como no desenvolvimento de tecnologia avançada para a análise de açúcares. Em termos de avanço tecnológico, a espectroscopia de Ressonância Nuclear Magnética (RMN) de alto-campo vem ajudando não só na elucidação estrutural dos carboidratos mas, tambem na dinâmica e conformação desses compostos. Em termos de novas ações biológicas, os carboidratos vêm revelando papéis cruciais tanto na fisiologia do organismo como da célula. Os açúcares participam dos eventos de sinalização, migração e crescimento celular, assim como em eventos fisio-patológicos como câncer, coagulação e trombose, inflamação e infecção por bactérias, protozoários e vírus. Além disso, os carboidratos podem desempenhar ações farmacológicas importantes. Como por exemplo, o caso da heparina sódica, um polissacarídeo sulfato complexo, amplamente explorado na clínica como anticoagulante.

A heparina não é o único polissacarídeo terapêutico. Muitos outros existem principalmente aqueles extraídos de organismos marinhos. Estes polissacarídeos do mar possuem estruturas e funções diferenciais quando comparados com aqueles polissacarídeos terrestres. Os principais polissacarídeos terapêuticos marinhos são as fucanas e galactanas sulfatadas, quitina e quitosano, e alguns glicoconjugados. Recentemente, publicamos um livro condensando as informações científicas recentes sobre esses efeitos terapêuticos dos carboidratos oriundos do glicoma marinho. Este livro é uma compilação de capítulos escritos por pesquisadors internacionais de diversos países tais como França, Brasil, Índia, Turquia, Japão e Coréia do Sul, e está sob publicação da editora Nova Science Publishers, de Nova Iorque.

 Esperamos que este livro seja útil no objetivo de mostrar ao público a relevância do projeto Glicoma, assim como o impacto dos carboidratos marinhos de ações terapêuticas estudados dentro deste projeto internacional.

Vitor H. Pomin, Laboratório de Coagulação e Trombose, Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, Instituto de Bioquímica Médica, UFRJ.