Pequena molécula pode ajudar a detectar a doença de Alzheimer em estágios iniciais
Pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB-UFRJ) e do nosso Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis (IBqM) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) identificaram que níveis elevados de uma pequena molécula chamada D-serina estão associados com o declínio cognitivo na doença de Alzheimer (DA).
A descoberta tem o potencial de estabelecer um novo biomarcador que seja eficaz para o diagnóstico precoce dessa doença neurodegenerativa, que afeta milhões de pessoas no mundo inteiro.
A Molécula D-serina
A D-serina é um aminoácido – classe de moléculas que podem compor proteínas ou atuar de forma independente para transmitir sinais fisiológicos no corpo humano. A D-serina pertence à subclasse de D-aminoácidos, que muitas vezes não integram proteínas, mas tem importantes funções de sinalização. Um dos autores seniores do estudo, Prof. Rogerio Panizzutti (M.D, PhD), seus colegas e outros pesquisadores já vêm relatando que a D-serina está presente no cérebro e atua como uma molécula essencial de sinalização nas sinapses – pontos de contato entre os neurônios onde sinais neuronais são propagados.
A D-serina como biomarcador precoce para a Doença de Alzheimer
Agora, ao olhar para o cérebro de pacientes com doença de Alzheimer e comparar com indivíduos sem a doença, a equipe liderada pelos Professores Rogerio Panizzutti (ICB) e Sergio T. Ferreira (IBqM) constatou que a D-serina é anormalmente elevada no hipocampo e córtex, regiões cerebrais afetadas na DA. Eles verificaram ainda que o aumento de D-serina pode ser causado pelo acúmulo de oligômeros do peptídeo beta-amilóide, toxinas que desempenham um papel central na fase inicial da doença.
A descoberta principal, no entanto, é que os níveis de D-serina são elevados no fluido cerebroespinhal de pacientes portadores da doença que já exibem sintomas clínicos precoces. Atualmente, o diagnóstico definitivo da doença de Alzheimer só é possível após investigação patológica de cérebros post-mortem e a falta de um biomarcador efetivo para detectar a doença precocemente impede esforços para deter ou reverter sua progressão.
Prognóstico por D-serina
No entanto, através da combinação de dados de avaliações cognitivas em pacientes, níveis do peptídeo beta-amilóide no fluido cerebroespinhal e níveis de proteína tau, os autores identificaram um grupo de pacientes que provavelmente sofrerão progressão para doença de Alzheimer (DA). Nesses pacientes, os níveis de D-serina no fluido cerebroespinhal foram claramente superiores do que em grupos controles sadios, pareados por idade, ou mesmo em pacientes afetados por doenças não relacionadas. Além disso, os níveis de D-serina no fluido cerebroespinhal se correlacionaram com o declínio cognitivo em pacientes com provável DA, sugerindo que se poderia melhorar a predição clínica para deter o avanço da doença.
Para testar essa possibilidade, os autores Caroline Madeira, Mychael V. Lourenço, Sergio T. Ferreira e Rogério Panizzutti incluíram as medidas de D-serina em um índice amilóide-tau (IATI) que tem sido proposto para auxiliar no diagnóstico da doença de Alzheimer. A incorporação das medidas de D-serina ao IATI melhorou notavelmente a sensibilidade e a especificidade de diagnóstico, indicando que a D-serina pode, efetivamente, ser adicionada a um painel de biomarcadores destinados a detecção inicial de DA.
Este trabalho tem como autores principais o Prof. Sergio T. Ferreira e seu aluno de Doutorado Mychael V. Lourenço, ambos do IBqM, e também dos pesquisadores Caroline Madeira e Rogério Panizzutti (ICB), além de outros colaboradores. Estes resultados foram recentemente publicados na revista Translational Psychiatry.
Embora níveis normais de D-serina sejam necessários para o bom funcionamento do cérebro, níveis excessivos podem ser prejudiciais e contribuir para a DA. Mas o mais interessante é que este estudo piloto revelou que a D-serina pode ir além de suas funções neuromoduladoras, tendo aplicações clínicas e servindo como um potencial biomarcador para a DA. Novos estudos em grupos maiores de pacientes são necessários para replicar estes resultados e confirmar o potencial clínico dessa molécula.
Referência: “D-serine levels in Alzheimer’s disease: implications for novel biomarker development.” Madeira and Lourenco et al, Translational Psychiatry, 2015
Acesse o artigo original: http://www.nature.com/tp/journal/v5/n5/full/tp201552a.html